Que toda
criatura se torne reflexo de vossa bondade, Senhor!
Li hoje este texto, de um informativo
que recebo do Mosteiro da Ressurreição. Achei interessante e partilho com
vocês!
Numa tarde de primavera, estava eu
trabalhando feliz no jardim do nosso Mosteiro da Ressurreição, quando fui
saudado por um visitante muito animado e interessado em saber como vivíamos
nesse ambiente de paz quase palpável, envoltos em Deus, ou melhor, Deus tão
envolto em nós como uma belíssima e misteriosa névoa matutina, tão presente e
ao mesmo tempo intocável.
Naquele mesmo instante soou o sino das
dezessete horas, e o visitante, mais que depressa, perguntou-me: Este sino está
convidando os monges a orar ou trabalhar? É para o “Ora” ou para o “Labora”?
Respondi-lhe docemente que segundo a Tradição monástica, o monge deve estar sempre
em oração, de acordo com a primeira Epístola aos Tessalonicenses, 5,17 que nos
pede “orai sem cessar”.
Então o visitante ficou confuso e meio
que sem jeito perguntou-me: “Mas vocês só rezam”? Respondi-lhe dizendo que
rezamos e trabalhamos; e não só isso, pois também temos momentos de convivência
fraterna e momentos de recolhimento, fazemos as refeições, lavamos a louça, as
roupas, limpamos o mosteiro, trabalhamos na terra, cuidamos dos animais,
atendemos e orientamos as pessoas que nos procuram, pintamos ícones, fabricamos
velas, cozinhamos e realizamos tantos outros trabalhos, muitos deles tão
discretos e eficazes, visto somente por Deus.
Muito mais alegre fiquei quando percebi
o rosto admirado e alegre daquele visitante, não podendo esconder sua emoção ao
dizer: “Então vocês são pessoas normais”? Num sorriso descontraído,
perguntei-lhe o que ele entendia por “normal”. A resposta veio de maneira
espontânea:”Homens, e não anjos”. Ao ouvir sua resposta, veio-me muito forte a
passagem do Livro do Gênesis 1,26 “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança”,
do Evangelho segundo João 1, 14 “E o verbo se fez carne e habitou entre nós”, e
da primeira Epístola de João 4,8 “Deus é amor”.
Deus pensou com carinho no ser humano,
criou-o à sua imagem, ou seja, colocou no homem a sua essência: Amor. E soprou
em suas narinas o hálito vital, o acompanhou e o sustentou durante a História
da Salvação e, por fim, enviou seu único Filho para dar sua vida em resgate do
homem. Deus se fez homem para divinizar o homem, pois quanto mais humano, mais
divino.
O visitante ficou impressionado! Tantos
véus se lha caíam da face, tantas histórias de mosteiros e conventos inventadas
e transmitidas por seus antepassados eram-lhe desfeitas num pequeno momento de
conversa com um monge. Cheio de coragem, ele perguntou:”Mas como vocês vivem
aqui? Como é o dia a dia de vocês?
Respondi-lhe dizendo que o nosso dia é
bastante longo; normalmente nos levantamos às 4 horas da madrugada e às 4h20
min iniciamos o nosso primeiro momento de oração, chamado de Vigílias, por ser
celebrado de madrugada, nas vigílias da noite, onde, segundo a Tradição
monástica, o Senhor Jesus voltará de madrugada; e assim encontrará os monges,
orando na Igreja do Mosteiro. Durante todo o dia, temos mais seis momentos de
oração na capela e assim passamos o dia entre trabalho e oração, recolhimento,
leitura e convívio com os irmãos de hábito.
“Vocês levantam-se às 4 horas da manhã?”!
“Sim”, respondi-lhe prontamente. E ele continuou: “É fácil para você se
levantarão cedo”? Sorrindo, respondi-lhe com sinceridade: “Não”! Ele riu,
compreendendo que tudo na vida exige um querer, um esforço pessoal. Então ele
perguntou-me: “O que mais lhe toca ao celebrar as Vigílias”? “Fico sempre
tocado pelas orações lidas pelo hebdomadário logo após o hino, onde muitas
delas fazem menção de toda a humanidade, com suas lutas, seus esforços, seus
medos, suas conquistas. Mas uma delas me chama muito a atenção, que é a oração
da quinta-feira da primeira semana, que reza assim: “Pai de bondade, vigiai
sobre vossos filhos ainda mergulhados na noite; que ninguém se
esquive do vosso olhar de misericórdia, mas que toda criatura torne-se reflexo
de vossa bondade, em Jesus, o Cristo, vosso Filho e nosso irmão, na unidade do
Espírito Santo”.
Então o visitante confidenciou-me que
estava sedento de Deus, que não sentia o chamado à vida monástica, mas que
gostaria de aprender a orar sem cessar e assim transformar e santificar seus
momentos de trabalho e dar mais qualidade aos momentos de lazer com a família.
Foi então que lhe recomendei a leitura de um pequeno livro, mas muito profundo
sobre a oração e o trabalho, com o título “Orar e trabalhar”, escrito por
Anselmo Grun e Fidelis Ruppert. O visitante despediu-se com um abraço afetuoso
e seguiu seu caminho com uma esperança viva e alegre de poder beber um pouco da
espiritualidade beneditina, tirada da Sagrada Escritura, e assim dar mais sabor
a sua vida, sendo sempre mais aquilo que Deus é: Amor e bondade.
Dom
Adalberto Savicki, OSB